Por Fernanda Oliveira
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Domingo, 29 de janeiro de 2023
Artigo
VAMOS FALAR SOBRE O AMOR
A maioria das músicas apaixonadas e dos romances novelescos aponta o amor como um sentimento sofrível, algo tão doloroso que será capaz de nos impelir os impulsos mais obscuros e as tendências mais desconfortáveis que possamos esconder dentro de nós. Uma espécie de angústia que nos remói por dentro e revira nossas entranhas.
Há um quê de primitivo nessa dor, nesse desespero, nesse afeto intenso e irregular, que nos assombra à noite quando estamos a pensar no par romântico.
Mas será que a
dramaticidade do amor é justamente aquilo que o define? Aliás, existe amor fora do espectro romântico? Algo descrito como tão nobre e transcendente,
tão sublimado no seu desinteresse, por essência, tão devoto ao objeto de
apreciação, seria compatível com o desespero, a dor e outros consorciados
negativos?
Prefiro pensar que toda a orientação obsessiva diz muito mais sobre o amor não correspondido ou ao eterno medo humano de rejeição (porque não a negação do amor?), do que o amor em si, um sentimento mais duradouro e estável do que poderíamos sugerir. Vamos conversar sobre isso?
Duas questões devem inaugurar esse bate-papo: como os primeiros apegos na infância influenciam nossos relacionamentos do futuro e a diferença substancial entre sentimentos e emoções.
John Bowlby foi o precursor da teoria do apego na psicologia para justificar a importância dos primeiros relacionamentos do indivíduo no seu desenvolvimento pessoal. Para o psicanalista, o apego é algo inerente a todo ser humano.
Ele envolve uma figura principal de apego (o provedor da atenção); o apegado (a pessoa que demanda a atenção) e uma relação de dependência. A criança, por exemplo, buscaria firmar vínculos porque precisa sobreviver, a necessidade de cuidados é o que fixaria os laços dela com alguém capaz de suprir essa demanda.
Em regra, esse é um papel designado aos pais, pois em teoria seriam as pessoas que mais teriam que conviver com um bebê, mas essa não é uma realidade absoluta diante do estilo de vida atual, razão pela qual os professores, cuidadores ou outros parentes podem exercer a figura de apego principal.
O apego, portanto, é um vínculo instintivo, uma emoção que envolve tantas outras, como medo, abandono e rejeição, dado que deve existir algum interesse por parte do apegado. Compreenda que os interesses não precisam ser materiais, eles podem se basear na manutenção de um relacionamento, no ímpeto por companhia, carência afetiva, etc.
A degeneração
do vínculo pode engatilhar problemas de comportamento e emoções não sadias, que
por sua vez darão vazão a sentimentos ruins ou que estariam baseados em experiências
de trauma. Isso nos leva à segunda questão desse tópico: qual seria a diferença
entre emoções e sentimentos?
As emoções são reativas, espontâneas,
inconscientes, incontroláveis, porque são nossa primeira reação a algum evento
ou pessoa. Elas são respostas instintivas que determinam nossas experiências
fisiológicas, como o disparo de hormônios, ativação de músculos e órgãos, já
que refletem situações que nos exigem ação (são emoções, por exemplo, medo,
raiva, ciúmes, etc.).
Existem tantas reações distintas sobre um
mesmo fato, exatamente porque nossas respostas emocionais não são as mesmas,
nossas experiências de vida forjam reações emocionais e sentimentais muito
diversas.
Enquanto as emoções são passageiras e de
ocorrência espontânea, os sentimentos seriam o processamento dessas emoções;
aquilo que fazemos da emoção dentro de nós. São, portanto, a segunda reação
sobre algo ou alguém, uma experiência consciente de leitura emocional que trará
um contexto psíquico e significativo para nosso cérebro.
Segundo Rodrigo Fonseca, Presidente da Sociedade Brasileira de Inteligência Emocional (SBie), se percebemos as emoções e não fazemos nada sobre elas, sem movê-las, estaríamos diante de uma oportunidade para o adoecimento.
Dentro dessa conjuntura podemos dizer que o apego é uma emoção, uma fisiologia ligada a nossa necessidade, imaginária ou não, de autopreservação, ao tempo que o amor é um sentimento, que exige um processo interno de construção e aclimatação, a par de qualquer dependência, dado que o amor não deixa de existir na ausência da figura de apego.
De acordo com os gregos antigos há três tipos de amor, pois o sentimento não se limita à expectativa romântico-passional. Eles podem ser identificados pela natureza dos relacionamentos e pelas características das interações interpessoais, são eles: Eros, Philia e Ágape.
Eros estaria associado ao amor romântico, ao prazer sexual e à atração física. Esse seria o senso comum do amor, largamente representado nos contos e nas fábulas pelos encontros apaixonados e pelas promessas do amor eterno entre príncipes e princesas.
A Philia seria o que conhecemos por amor fraterno, a amizade verdadeira e não superficial, o desejo constante pelo bem do outro. Já o Ágape seria o amor transcendente, o amor ao próximo sem limitações de seita, o mais próximo do amor incondicional.
Na indústria audiovisual contemporânea conseguimos identificar a exploração ascendente de outras formas de amor que não a romântica. Veja por exemplo o filme “Frozen” que aborda o amor entre irmãs, ou “Malévola” que aborda o amor parental.
Como o amor é um sentimento, o cultivo refletido de emoções, ele não se inclina à brevidade das sensações explosivas ou intensas. Podemos pensá-lo como um acervo bem distribuído de capacidades emocionais, algo duradouro em essência.
Ser duradouro, no entanto, não significa ser inquebrantável, que não mereça atenção e trabalho, os micro gestos de gentileza do dia-a-dia, por exemplo, são grandes performadores da manutenção do amor quando ele existe.
Por esse motivo, os sentimentos requerem trabalho, desenvolvimento e preservação. As emoções devem ser refinadas para que possamos compreendê-las e desenvolvê-las na direção dos sentimentos edificantes, para que dessa forma sejamos capazes de planejar e antever nossos comportamentos e respostas sociais. Logo, sentir e nutrir amor ou qualquer outro sentimento etéreo é desdobramento de uma inteligência emocional conquistada! Lembre-se de que você não precisa estar sozinho nessa conquista, pois sempre poderá contar com o auxílio da terapia no gerenciamento emocional.
Fernanda Oliveira
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